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A Relevância da Prevenção Acidentária

E O RESUMO DOS PROCESSOS JUDICIAIS RELACIONADOS A ACIDENTE DE TRABALHO

 

FERNANDO RUBIN, Advogado, Bacharel em Direito pela UFRGS, com a distinção da Láurea Acadêmica. Mestre em processo civil pela UFRGS, com dissertação publicada pela Editora Livraria do Advogado a respeito do instituto da Preclusão na Dinâmica do Processo Civil. Professor da Graduação e Pós-graduação do Centro Universitário Ritter dos Reis – UNIRITTER – Laureate International Universities. Professor Colaborador do Centro de Estudos Trabalhistas do Rio Grande do Sul – CETRA-IMED. Professor colaborador do Centro de Orientação, Atualização e Desenvolvimento Profissional – COAD-ADV. Professor Pesquisador do Mérito Estudos de Porto Alegre. Articulista de diversas revistas em direito processual civil, previdenciário e trabalhista.

 

Resumo: Em período de discussão mais acentuada em relação à proteção jurídica do trabalhador, apresentar-se-á, em largas linhas, a estrutura legal de prevenção e repressão que gira em torno do acidente de trabalho no Brasil. De acordo com a melhor doutrina e o entendimento prevalente da jurisprudência, desenvolver-se-á de maneira lógica quais são os mecanismos de prevenção acidentária, passando pelos encargos (suportados pela empresa) em caso de não prevenção, sendo destacados por fim, quais são as três centrais, e autônomas, demandas judiciais envolvendo um infortúnio laboral, sem deixar de ser mencionada a possibilidade de apresentação de uma anômala (quarta) demanda – ação regressiva proposta pelo INSS contra o empregador negligente.


Sumário: Resumo. Introdução. 1. Mecanismos de prevenção acidentária. 2. Encargos em caso de não prevenção acidentária. 3. Aspectos relevantes da ação regressiva. 4. Rol de demandas judiciais envolvendo acidente de trabalho. Conclusão. Referências doutrinárias consultadas.

 

 


Introdução


Se é bem verdade que vivemos atualmente um cenário de queda dos índices de acidente de trabalho no Brasil, ainda assim podemos dizer que o patamar de incidência dos infortúnios laborais são muito altos. De acordo com dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que, desde 2003, adotou 28 de abril como Dia Mundial da Segurança e Saúde no Trabalho, ocorrem anualmente 270 milhões de acidentes de trabalho em todo o mundo; no Brasil, segundo o relatório, são 1,3 milhão de casos[1].

Tanto é verdadeira a assertiva que, em virtude de um número elevado de demandas de reparação de dano em razão de acidente de trabalho, foram recentemente adotadas medidas de prioridade nos julgamentos trabalhistas pátrios, de acordo com a recomendação conjunta assinada em 03/05/2011 - primeira medida concreta do protocolo de Cooperação Técnica firmado pelo TST com os Ministérios da Saúde, do Trabalho e Emprego, da Previdência Social, Advocacia-geral da União e Conselho Superior da Justiça do Trabalho.

Tal situação aponta para a importância do tema acidentário, especialmente os mecanismos de prevenção acidentária, já que, conforme buscaremos expor, em ocorrendo o infortúnio laboral a empresa será penalizada pecuniariamente de múltiplas maneiras.

Ciente dessas premissas, e desse contexto, destacaremos as principais medidas preventivas e repressivas em matéria acidentária, bem como a competência jurisdicional dessas demandas, com ênfase na ação regressiva proposta pelo INSS contra o empregador negligente.


1. Mecanismos de prevenção acidentária


O ordenamento jurídico brasileiro estabelece regras para a prevenção em matéria acidentária, as quais visam tornar o ambiente de trabalho um local saudável e, tanto quanto possível, prazeroso para os empregados. O estabelecimento de tais mecanismos (documentalmente registrados), em geral, são de responsabilidade da empresa, que responde por omissão em caso de o acidente laboral ocorrer em virtude de inexistência ou má operação desses mecanismos.

Estamos tratando de documentos vinculados ao Serviço Especializado de Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SEESMET) e à Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), de cuja atuação e interação decorrem especialmente o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), e o controle sobre a utilização obrigatória do Equipamento de Proteção Individual do empregado (EPI).

Com o objetivo de diminuir o número de acidentes de trabalho no Brasil, a legislação evoluiu para exigir medidas preventivas mais sérias das empresas, sendo tal esforço bem identificado com a publicação da Portaria n° 3.214/78 do Ministério do Trabalho e Emprego, e a conseqüente vigência de 33 Normas Regulamentares (NRs), que dispõem sobre procedimentos obrigatórios relacionados à medicina e à segurança no trabalho[2].

Considera-se EPI todo dispositivo ou produto, de uso individual utilizado pelo trabalhador, destinado à proteção de riscos suscetíveis de ameaçar a segurança e a saúde no trabalho. É dever da empresa fornecer aos empregados gratuitamente o equipamento adequado, sendo, pois, fator importante na fixação da indenização por acidente de trabalho o fato de o empregador não fornecer e/ou não exigir o uso do material, resultando daí o evento infortunístico[3].

Da mesma forma, é importante, notadamente nas lides de reparação de danos contra o empregador, a juntada pela própria empresa do PCMSO e do PPRA, a fim de se averiguar se foram tomadas as medidas preventivas para evitar o acidente de trabalho – sendo daí importante a empresa contratar, respectivamente, um especialista Médico do Trabalho e um Engenheiro do Trabalho para fins de implementar e controlar adequadamente o desenvolvimento de tais programas de prevenção.


2. Encargos em caso de não prevenção acidentária


Não há maiores dúvidas de que o objetivo de todos os profissionais envolvidos em medicina e segurança no trabalho, hoje no Brasil, é prevenção em matéria acidentária, até mesmo porque os encargos decorrentes de negligência da empresa no evento infortunístico são altíssimos.

Os informados programas, custeados pela empresa, são integrantes do conjunto de iniciativas patronais no campo da saúde dos trabalhadores, sujeitando o empregador, em caso de falhas comprovadas[4], a uma (a) sensível indenização ao empregado acidentado – além, especialmente, da (b) possibilidade de ser ajuizada ação judicial regressiva pelo INSS[5] e sofrer (c) penalidades administrativas a cargo da Delegacia Regional do Trabalho (DRT), atualmente Superintendência Regional do Trabalho, e de seus Agentes de Inspeção (Auditores Fiscais do Trabalho)[6]. Há ainda a (d) incidência de uma contribuição previdenciária mais elevada (SAT/FAP) em razão de um eventual número progressivo de acidentes de trabalho dentro da empresa, podendo a penalidade atingir até 6% da sua folha[7]. E, por fim, (e) sabe-se que os primeiros 15 dias de afastamento do obreiro da atividade laboral é causa de interrupção do contrato de trabalho, devendo a empresa arcar com todos os custos e salário do trabalhador nesse período de meio mês[8], o que acaba por onerá-la em mais uma frente (o quinto pesado encargo, ora listado).

Somados todos esses encargos que recaem sobre os ombros da empresa, parece evidente que a melhor solução patronal é investir realmente em prevenção acidentária, contratando pessoal qualificado e dando voz aos cipeiros para que as estruturas internas preventivas funcionem bem e evitem abalos graves à saúde do empregado à própria saúde (financeira) do empregador.


3. Aspectos relevantes da ação regressiva


Dentre os cinco encargos suportados pela empresa em caso de acidente de trabalho, acima referidos, necessário desenvolvermos mais algumas linhas a respeito da ação regressiva proposta pelo INSS em desfavor da empresa negligente – em razão dos mais recentes dispositivos legais que passaram a viger recentemente.

Ocorre que a Lei de Benefício (Lei n° 8.213/91) ao regular a matéria, no art. 120, informa que a ação regressiva deveria ser proposta pelo órgão previdenciário em toda e qualquer situação de incidência de evento infortunístico em razão de negligência da empresa, na prevenção acidentária, o que se daria em face de não cumprimento das normas de segurança e higiene no trabalho. Complementa o dispositivo legal, a previsão do art. 341 do Decreto n° 3.048/99, o qual prevê que o Ministério do Trabalho e Emprego, com base em informações fornecidas trimestralmente, a partir de 1° de março de 2011, pelo Ministério da Previdência Social relativas aos dados de acidentes e doenças do trabalho constantes das comunicações de acidente de trabalho registradas no período, encaminhará à Previdência Social os respectivos relatórios de análise de acidentes do trabalho com indícios de negligência quanto às normas de segurança e saúde do trabalho que possam contribuir para a proposição de ações judiciais regressivas.

No entanto, restringindo, em boa medida, a área de concentração das ações regressivas, a Resolução MPS/CNPS n° 1291/2007 explicita que os procuradores do INSS devem priorizar as situações que envolvam empresas consideradas grandes causadoras de danos e aquelas causadoras de acidentes graves, dos quais tenham resultado a morte ou a invalidez dos segurados. Ao que tudo indica, o genérico comando contido na Lei de Benefícios era difícil de ser cumprido, sendo proposto aos procuradores autárquicos, que, ingressem com a demanda regressiva, ao menos, nos casos mais graves envolvendo culpa ou mesmo dolo do empregador.

Com base na aludida Resolução MPS/CNPS n° 1.291[9], o INSS, por intermédio de sua procuradoria, vem ajuizando ações regressivas apoiadas em provas emprestadas de ações de reparação de danos ajuizadas na justiça do trabalho, pelo trabalhador ou seus herdeiros, contra o empregador. É bem verdade que em muitas desses demandas há condenação da empresa pela mera aplicação da teoria do risco (responsabilidade objetiva), sendo certo que na ação regressiva, daí decorrente, pode ser exigido do INSS que explicite a circunstância de culpa grave ou dolo que determine a procedência do pleito (com base então na responsabilidade subjetiva do empregador).


4. Rol de demandas judiciais envolvendo acidente de trabalho


Em razão de um mesmo acidente de trabalho, poderá o trabalhador ajuizadar três autônomas demandas judiciais, tudo de acordo com a legislação em vigor, especialmente o art. 7°, XXVIII da CF/88.

Ocorrendo um acidente no trabalho (acidente típico, doença ocupacional) ou no trajeto para o trabalho (acidente in itinere) é possível que o trabalhador (celetista[10]) necessite de um maior período de afastamento para recuperação adequada do quadro infortunístico. A partir do 16° dia de afastamento, cabe ao órgão previdenciário (INSS) conceder benefício acidentário ao empregado lesionado, realizando perícias de rotina para avaliar o desenvolvimento do quadro clínico e as perspectivas de retorno do acidentado ao mercado de trabalho, para a prática da mesma atividade profissional ou para outra compatível com as suas atuais limitações funcionais.

Permanecendo o obreiro por mais de quinze dias afastado do trabalho, será determinado pelo INSS a concessão de um benefício provisório – o auxílio-doença; sendo realmente improvável que se faça a opção imediata pela concessão de um benefício de natureza definitiva – o auxílio-acidente ou até mesmo a aposentadoria por invalidez. Em casos acidentários mais graves, é de praxe a concessão pelo INSS de certo período para análise das peculiaridades do problema de saúde, em um Centro de Reabilitação Profissional (quando mantido o segurado em benefício provisório), para um posterior encaminhamento da melhor solução definitiva (quando então cogitada a possibilidade de transformação do benefício provisório em definitivo).

Pois bem. Qualquer discussão a respeito de eventual ilegalidade nesse trato administrativo de concessão de benefício acidentário deverá ser resolvido na via judicial. Tal demanda judicial é de denominada Ação Acidentária contra o INSS, de acordo com a Lei 8.213/91 – e corre perante a Justiça Estadual em razão de competência constitucional já assentada pela histórica Súmula 15 do STJ, tendo em Porto Alegre vara cível especializada (Vara de Acidentes de Trabalho – VAT).

A outra demanda autônoma que pode ser ajuizada pelo empregado é a chamada Ação de Reparação de Danos contra o empregador, de acordo com o Código Civil e legislação trabalhista (CLT) – corre na Justiça trabalhista buscando indenização por danos morais e materiais decorrentes do infortúnio laboral, tendo em Porto Alegre vara trabalhista especializada (30ª Vara do Trabalho).

A adoção da teoria subjetiva, ou seja, responsabilidade civil do empregador por dolo ou culpa, no caso de acidente do trabalho, conforme previsão do já citado art. 7°, XXVIII da CF/88, se deve ao fato de que, ao lado da responsabilidade civil, existem os benefícios acidentários, que são inspirados na teoria objetiva (teoria do risco social). Por outro lado, desde a década de 60, com a Súmula nº 229 do STF, se permite cumular as reparações previdenciárias e civis decorrentes do trabalho. Se a reparação previdenciária é cumulável com a reparação civil, e ela é baseada na teoria objetiva, ao empregador somente seria obrigatório indenizar quando o feito ultrapassasse o risco natural da relação de trabalho. Por essa razão se entendeu que a reparação básica (previdenciária) seria orientada pela teoria do risco e a reparação mais severa (responsabilidade civil) teria que demonstrar culpa ou dolo do empregador. Saliente-se que a CF/88 trouxe um avanço, mesmo dentro da teoria subjetiva, ao afastar o conceito de culpa grave previsto na Súmula nº 229 e dispor ser devida a reparação apenas por culpa (levíssima, leve ou grave)[11].

Em se tratando de incapacidade laborativa decorrente do trabalho, o obreiro além da ação contra o INSS (ação acidentária) e contra o empregador (ação de reparação de danos), possui a oportunidade jurídica de ingressar contra a seguradora privada – Ação Securitária –, em demanda que deve correr em vara cível comum (Justiça Estadual), a fim de buscar um prêmio em decorrência do sinistro pelo qual pagou por boa parte de sua vida dentro da instituição empregadora.

O seguro privado em razão de acidentes pessoais é oferecido, e não imposto, aos empregados via apólice coletiva. Sendo de interesse expresso do trabalhador, passa a ser descontado em contra-cheque, tendo em geral como estipulante o próprio empregador. Não raro o empregador constitui pessoa jurídica própria para administrar o seguro privado dos funcionários, sendo previstas coberturas pelos eventos infortunísticos desenvolvidos dentro do ambiente de labor, como o acidente típico (como a perda de segmento) e a doença laboral (como a Lesão por Esforços Repetitivos).

A nominada ação de cobrança trata-se de demanda cível em que o estipulante não figura, por regra, como litisconsorte. No pólo ativo visualiza-se a figura do obreiro-segurado, que adquiriu o problema de saúde ocupacional em meio ao contrato de trabalho, e no pólo passivo a figura da seguradora privada, que se compromete a indenizar o segurado em caso de ocorrência do sinistro nesses casos em que o evento infortunístico não é prévio à contratação, aplicando-se prioritariamente o Código de Defesa do Consumidor.

Como não há identidade entre o empregador e a seguradora privada, o mesmo acidente de trabalho poderá determinar uma indenização pela empresa e o pagamento do prêmio segurado, sem qualquer compensação – dada a natureza jurídica distinta das relações firmadas. Tal lógica, aliás, é semelhante àquela, já bem explicitada, que prega a não compensação de verbas de reparação de danos com a do benefício acidentário pago pelo órgão previdenciário. Na verdade, o mesmo acidente de trabalho autoriza, repite-se, de forma autônoma, a cobrança de benefício acidentário, reparação de danos causados por dolo ou culpa do empregador e indenização contratual da seguradora.

Por fim, deve-se registrar que há espaço para se falar em uma quarta demanda judicial em caso de acidente de trabalho. Trata-se da já comentada Ação Regressiva proposta pelo INSS em desfavor do empregador que age negligentemente no trato da saúde do trabalhador, mormente naqueles casos em que age com culpa grave ou mesmo dolo – tudo de acordo com exegese articulada do art. 120 da Lei n° 8.213/91, art. 341 do Decreto n° 3.048/99 e art. 1° da Resolução MPS/CNPS n° 1.291/2007.

Questão interessante em relação à aludida ação regressiva é a de sua competência, já que a ação acidentária é proposta na justiça estadual e a ação de reparação de danos, como visto acima, é atualmente de competência da justiça laboral.

Corretamente, no nosso sentir, as ações regressivas vêm sendo interpostas, por grande parte dos procuradores do INSS, na justiça federal, com base no art. 109, I, da Constituição Federal, o qual regula que aos juízes federais compete processar e julgar as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho.

Não se pode olvidar, no entanto, que, existe corrente defendendo que a competência para o julgamento dessas ações é da justiça do trabalho, e, também, há um entendimento minoritário, que refere que a competência pertence à justiça estadual – tudo em razão, no nosso sentir, de verdadeira confusão em relação ao objeto daquelas demandas acidentárias e de reparação de dano com o objeto próprio da ação regressiva.

Cabe referir, por necessário, que quando existe o conflito de competência, cabe ao Superior Tribunal de Justiça dirimir o conflito, nos termos do art. 105, I, “d” da CF/88, e, a mais alta Corte infraconstitucional, já se manifestou favoravelmente a competência da justiça federal para o julgamento das ações regressivas, conforme ementa paradigmática ora acostada: “CONFLITO DE COMPETÊNCIA. ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO PROPOSTA PELO INSS CONTRA O EMPREGADOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. Compete à Justiça comum processar e julgar ação proposta pelo INSS objetivando o ressarcimento dos valores despendidos com o pagamento de pecúlio e pensão por morte acidentária, em razão de acidente de trabalho ocorrido nas dependências da empresa ré, por culpa desta. O litígio não tem por objeto a relação de trabalho em si, mas sim o direito regressivo da autarquia previdenciária, que é regido pela legislação civil. Conflito conhecido para declarar competente o Tribunal Regional Federal da 4ª Região”[12].

Temos então ao lado da ação acidentaria (j. estadual), ação de reparação de danos (j. trabalho) e ação securitária (j. estadual), uma quarta autônoma demanda, agora proposta não pelo lesionado, mas sim pelo próprio órgão estatal encarregado de prestar direto suporte ao segurado pelo período em que perdurar a convalescença – ação regressiva (j. federal).


Conclusão


De acordo com o estudo conduzido, infere-se que há elementos jurídicos de prevenção e repressão muito fortes em matéria acidentária, e que encontram arrimo em normas de todas as hierarquias. Há, pois, condições legais suficientes para a redução do número de acidentes de trabalho no país. Por parte dos Tribunais pátrios, vê-se, por outro lado, uma preocupação mais atual de estabelecer prioridade de julgamento de tais temas, sendo autorizado ainda que o obreiro lesionado discuta em diversas esferas (civil e trabalhista) o seu direito diante de uma limitação decorrente do infortúnio laboral.

Assim, poderá o trabalhador ingressar com ação acidentária contra o INSS, ação de reparação de danos contra a empresa e mesmo com ação securitária contra a seguradora privada, sem que seja determinada compensação de valores pela concomitância de pleitos de um mesmo agente. Isso sem contar a possibilidade de autônoma ação regressiva movida pelo órgão previdenciário contra o empregador que age negligentemente no trato da saúde do trabalhador, mormente naqueles casos em que age com culpa grave ou mesmo dolo (justiça federal).

Importante, pois, a divulgação/troca de informações, de forma multidisciplinar, a fim de ser possível maior cobrança na aplicação prática das disposições que garantam a saúde do trabalhador, a partir da formação de um ambiente saudável de trabalho; servindo ainda as decisões pecuniárias dos Tribunais como penalidades jurídicas importantes para que se ajude a precipitar a formação de consciência das empresas a respeito da importância de séria proteção ao trabalhador, servindo o incremento das ações regressivas, nesse sentido, como relevante medida pedagógica.

Todas essas questões indicam para a importância da empresa implementar de maneira efetiva medidas de prevenção, cumprindo com rigor as determinações contidas no PCMSO e no PPRA, dando espaço para atuação independente e segura dos médicos do trabalho e dos engenheiros do trabalho, além de incentivar a colaboração permanente e interessada da CIPA, a fim de que o número de acidentes de trabalho diminua ainda mais e, por conseqüência, sejam reduzidas as penalidades das empresas diante de um evento infortunístico.

Penalidades essas que são pesadas e podem ser cumulativas, a saber: encargos referentes aos primeiros 15 dias de afastamento do obreiro da atividade laboral; penalidades administrativas a cargo da Superintendência Regional do Trabalho; incidência de uma contribuição previdenciária mais elevada (SAT/FAP); indenização em ação de reparação de danos movida pelo empregado; e, ainda, indenização em ação regressiva movida pelo INSS.


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[1] O relatório da OIT registra que, a cada ano, ocorrem aproximadamente 2,2 milhões de mortes relacionadas a acidentes ou doenças do trabalho, tudo isso causando um custo econômico equivalente a 4% do PIB, cerca de 20 vezes superior a todos os recursos destinados à ajuda oficial ao desenvolvimento no mundo - dados obtidos no site OIT BRASIL (www.oitbrasil.org.br), acesso em: 13 maio. 2011.

[2] No contexto dessas 33 NRs, há espaço próprio para a regulamentação do SEESMT (NR n° 4), CIPA (NR n° 5), EPI (NR n° 6), PCMSO (NR n° 7) e PPRA (NR n° 9).

[3] A prova do não fornecimento do EPI, ou ainda de inexistência de exigência do empregador para o uso adequado do equipamento, embora possa ser provada documentalmente, é geralmente objeto de prova oral nas ações judiciais.

[4] Seguramente a falha comprovada mais grave seria a própria inexistência dos Programas ao tempo de ocorrência do acidente do trabalho, sendo demonstrado judicialmente que a empresa passou a se preocupar com prevenção acidentária, constituindo o PCMSO e o PPRA, em momento subseqüente à ocorrência do evento infortunístico.

[5] A ação judicial regressiva está baseada no art. 120 da Lei nº 8.213/91, estabelecendo o dispositivo infraconstitucional a possibilidade do ajuizamento de demanda pelo INSS contra o empregador para cobrir os gastos que o órgão previdenciário arca com o pagamento de benefícios acidentários, justamente nos casos em que verificada negligência quanto às normas-padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva.

[6] Cabível a menção à DRT, já que a legislação que organiza a medicina e segurança do trabalho prevê instrumentos para o Estado fiscalizar e punir as empresas descumpridoras da lei. Nesse sentir, a NR n° 28 traz disposições gerais sobre fiscalização e penalidades administrativas.

[7] A criação do Fator Acidentário de Prevenção (FAP), incidindo sobre o Seguro Acidente de Trabalho (SAT) é inovação concretizada pelo ordenamento jurídico brasileiro, a partir do início de 2010 (Decreto 6577/2008), e busca tornar mais justa a cobrança da contribuição previdenciária das empresas, de acordo com a sua real participação no incremento dos números de acidentados no país ao ano.

[8] Pagamento de 15 dias prévios ao auxílio-doença acidentário (B91) – Lei 8.213/91 e Decreto 3.048/99.

[9] Art. 1º da MPS/CNPS n°. 1.291 Recomendar ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por intermédio de sua Procuradoria Federal Especializada - INSS, que adote as medidas competentes para ampliar as proposituras de ações regressivas contra os empregadores considerados responsáveis por acidentes do trabalho, nos termos do arts. 120 e 121 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, a fim de tornar efetivo o ressarcimento dos gastos do INSS, priorizando as situações que envolvam empresas consideradas grandes causadoras de danos e aquelas causadoras de acidentes graves, dos quais tenham resultado a morte ou a invalidez dos segurados.

Parágrafo único. Para facilitar a instrução e o andamento dos processos, recomenda à Procuradoria Federal Especializada - INSS que discipline a utilização de prova colhida em autos de ações judiciais movidas pelo segurado ou herdeiros contra a empresa, bem como que avalie a possibilidade de celebração de convênio com o Poder Judiciário para uso de processo eletrônico.

[10] O empregado celetista é, sem dúvida, o grande segurado obrigatório protegido contra acidentes de trabalho; mas também o trabalhador avulso e o segurado especial são segurados obrigatórios do sistema que podem obter a benesse acidentária, de acordo com a legislação previdenciária vigente.

[11] Se fosse interpretado isoladamente, não haveria dúvidas que o art. 7º, XXVIII, da Constituição brasileira consagra uma subjetiva responsabilidade civil do empregador por acidente do trabalho. A questão nevrálgica é que se mostra viável a interpretação sistemática daquele dispositivo constitucional com o art. 7º, XXII, que consagra a visão do risco. Este é o debate atual na doutrina e na jurisprudência brasileiras. Na condição atual, ainda prepondera a visão da responsabilidade subjetiva, mas começam a aparecer, cada vez em maior número, acórdãos no sentido da responsabilidade objetiva.

[12] Superior Tribunal de Justiça. Acórdão em conflito de competência nº. 2006/0050989-3. Autor: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS. Réu: Frigorífico Nicolini Ltda. Suscitante: Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Suscitado: Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Relator Min. Castro Filho, 19.10.2006.